Toda a Espanha se levanta

Contra o presente e o futuro de miséria
 Toda a Espanha se levanta

Por este caminho, em dez anos cerca de 40 por cento da população viverá na pobreza.
O governo liderado por Mariano Rajoy fez aprovar o Orçamento do Estado para 2013 sem fazer caso dos protestos massivos praticamente diários, realizados por vários sectores em todo o território, que alertam não apenas para a injustiça das medidas como para a cada vez mais evidente falência da receita aplicada, austera somente para o povo trabalhador.
No total, o documento, aprovado apenas pelos deputados do Partido Popular (PP), de Rajoy, prevê um montante recorde de cortes directos que chegam a quase 40 mil milhões de euros e pressupõe uma poupança de 150 mil milhões até 2014. Quanto à polémica «reforma da saúde», que tem levado centenas de milhares de espanhóis às ruas em dezenas de cidades, os eleitos do PP rejeitaram a esmagadora maioria das quase três mil emendas apresentadas sobre a matéria, ao mesmo tempo que aplaudiam medidas como o congelamento das pensões e dos salários ou o aumento das taxas na Justiça.

Antes da aprovação, Mariano Rajoy defendeu a acção do executivo do qual é chefe durante o primeiro ano de mandato que acaba de cumprir. O primeiro-ministro referiu-se às medidas aplicadas como «ambiciosas e imprescindíveis», gabou-se de estar a consolidar «as bases da recuperação económica», culpou o anterior governo de turno ao serviço do capital pelo estado depauperado da fazenda pública, endereçou, sem corar, uma mensagem de «esperança» aos que enfrentam as maiores amarguras, e teve a desfaçatez de concluir que «tudo o que este Governo faz é com o objetivo prioritário de recuperar as suas vidas e bem-estar».
Opinião diferente tem a maioria dos povos de Espanha, que numa sondagem recente difundida por agências noticiosas e meios de comunicação locais manifesta uma rejeição esmagadora (98 por cento dos inquiridos) para com o rumo imposto.

Mais elucidativas que qualquer pesquisa de opinião quanto à vontade popular, têm sido os protestos quase diários envolvendo centenas de milhares de pessoas, convocados por sindicatos, por estruturas representativas dos trabalhadores unidas a organizações políticas e sociais heterogéneas, por grupos cidadãos, etc; ou realizadas nos locais de trabalho partindo de questões concretas mostrando-as parte da ofensiva mais geral.


Ninguém se rende

Na luta emergem as jornadas protagonizadas pelos sectores da Saúde e Educação. Depois de na segunda-feira, 17, a Cúpula Social - que reúne mais de 150 estruturas em torno das Comissiones Obreras e da UGT – ter organizado retumbantes marchas reivindicativas em 56 cidades, profissionais de saúde e populações prosseguiram, nos dias seguintes, o que vêm fazendo há semanas com grande sucesso e mobilização, especialmente aos domingos em Madrid: acções de massas em defesa do serviço público de saúde e para exigir um referendo às medidas que o governo pretende implementar, argumentando, por exemplo, que a Saúde apenas custa 6,25 por cento do PIB (uma das mais baratas do mundo), ou 1500 euros/ano por cidadão.

Na Educação, o passado dia 14 foi data de uma jornada realizada em pelo menos 30 cidades em defesa dos postos de trabalho e da preservação da escola pública contra os «danos irreversíveis» que as medidas do governo irão provocar, como, aliás, sublinharam, dias mais tarde, professores, reitores, lentes e investigadores científicos numa iniciativa pública própria.

Os protestos chegam por vezes a assumir um carácter extremo, como o caso do ocorrido durante a greve dos trabalhadores dos transportes médicos da Galiza, onde duas ambulâncias foram atacadas, ou, noutro sentido, o aproveitamento do sorteio do El Gordo, realizada num teatro, dia 22, para protestar contra os despedimentos na televisão pública e a privatização da saúde em Madrid.


Paiol social


O desespero e o engenho contestatário acicatados pela violência da ofensiva e pelos seus efeitos não são de estranhar. Espanha é hoje um país que a OCDE diz poder chegar brevemente aos seis milhões de desempregados, registando, neste momento, a mais elevada taxa oficial de desemprego dos países industrializados; que a britânica Oxfam, a UNICEF e outras organizações atestam como um paiol social, já que, estimam, terá 40 por cento da população na pobreza em 2022– mais de 18 milhões de pessoas, em resultado de uma receita em tudo idêntica à aplicada nos anos 80 na América Latina (sic); mas onde, pelo contrário, no mesmo período, os 20 por cento mais ricos terão, em média, rendimentos 15 vezes maiores que os 20 por cento mais pobres (sic); cujo Tribunal Supremo alerta para o aumento das execuções hipotecárias, que só este ano cresceram 134 por cento, fazendo disparar os sem-abrigo, as famílias amontoadas em habitações exíguas para o total de ocupantes, e os suicídios por perda da habitação, o mesmo país no qual a banca continua a bater máximos de créditos de cobrança suspeita (são já cerca de 190 mil milhões de euros) prosseguindo a passagem dos chamados «activos tóxicos» ao denominado banco mau.


 
Fonte: Jornal Avante em www.avante.pt
 
 
 

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